quinta-feira, 15 de maio de 2014


CRÔNICA Nº 59

A VIDA DOS CEGOS


            É difícil imaginar a vida das pessoas cegas ou de pessoas que tenham quaisquer outras deficiências.
Fico pensando nos cegos porque os acho mais frágeis, por eles não conseguirem olhar nos olhos dos outros e sentirem se são sinceros  ou não. Penso nos riscos que correm ao atravessarem as ruas, ao perguntarem algo a alguém e serem enganadas, enfim... nas dificuldades e perigos que passam  andando pelas cidades deste país.
Onde moro, Salvador-Bahia, vemos cegos pelas ruas, indo ao médico, aos institutos onde aprendem braile, passeando em shoppings etc. No meu bairro vejo sempre um casal (homem e mulher) de cegos, os dois parecem que são casados ou são irmãos, não sei bem, mas a mim, parece mais que são casados. Andam por toda a parte, um segurando o braço do outro. Vejo muitas pessoas ajudando, orientando, avisando sobre quando atravessar as ruas e  dizendo os lugares onde estão. Fico impressionada como confiam na palavra daqueles que não veem.
Hoje foi a minha vez de ajudá-los. Um dia atípico na cidade, “blackout”  no Nordeste e em consequência em Salvador. Já com a energia restabelecida mais ou menos quatro horas depois, estava vindo do supermercado e passei no ponto de ônibus onde o casal costuma pegar o transporte, não havia absolutamente ninguém além deles naquele lugar, naquele horário, e pensei:
“Meu Deus, quem vai ajudá-los?”
Estava andando rapidamente, mas ao vê-los sozinhos, olhei para trás e vi que estava chegando um ônibus no ponto. Uma luz se acendeu em minha memória, talvez uma intuição  e uma vaga lembrança de que aquele ônibus era o que eles costumavam pegar, em outras ocasiões os vi tomando aquele transporte para aquele bairro. O “buzu” parou, eu voltei e perguntei pra eles:
- Pra onde vocês vão? Que ônibus vocês pegam? 
O homem não respondeu, mas a mulher  falou o lugar. Aí eu disse:
- O ônibus é este que parou.
Dei a mão para o motorista esperar, ele esperou e eles foram embora, um pouco antes de subirem o homem cego perguntou:
- É Tânia?
Eu respondi:
- Não. Seu ônibus é esse, tchau!
Não dava tempo me apresentar, explicar quem eu era etc.
Continuei a minha caminhada até a minha casa e fiquei muito feliz por ter podido ajudar. Normalmente já faço isso, ajudo as pessoas que precisam pela rua: atravesso pessoas idosas, cegos, dou informações corretas, levo até os lugares, se for necessário, cedo o lugar no ônibus. Ajo politicamente correto sempre que é necessário, não pra aparecer, mas porque aprendi com meus pais a respeitar e a tratar bem todas as pessoas.

 

Alba Brito Mascarenhas
Salvador, 28 de agosto de 2013

 

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