CRÔNICA
Nº 59
A
VIDA DOS CEGOS
É
difícil imaginar a vida das pessoas cegas ou de pessoas que tenham quaisquer
outras deficiências.
Fico pensando nos cegos
porque os acho mais frágeis, por eles não conseguirem olhar nos olhos dos
outros e sentirem se são sinceros ou
não. Penso nos riscos que correm ao atravessarem as ruas, ao perguntarem algo a
alguém e serem enganadas, enfim... nas dificuldades e perigos que passam andando pelas cidades deste país.
Onde moro, Salvador-Bahia,
vemos cegos pelas ruas, indo ao médico, aos institutos onde aprendem braile,
passeando em shoppings etc. No meu bairro vejo sempre um casal (homem e mulher)
de cegos, os dois parecem que são casados ou são irmãos, não sei bem, mas a
mim, parece mais que são casados. Andam por toda a parte, um segurando o braço
do outro. Vejo muitas pessoas ajudando, orientando, avisando sobre quando
atravessar as ruas e dizendo os lugares
onde estão. Fico impressionada como confiam na palavra daqueles que não veem.
Hoje foi a minha vez de
ajudá-los. Um dia atípico na cidade, “blackout”
no Nordeste e em consequência em Salvador. Já com a energia
restabelecida mais ou menos quatro horas depois, estava vindo do supermercado e
passei no ponto de ônibus onde o casal costuma pegar o transporte, não havia absolutamente
ninguém além deles naquele lugar, naquele horário, e pensei:
“Meu Deus, quem vai ajudá-los?”
Estava andando rapidamente,
mas ao vê-los sozinhos, olhei para trás e vi que estava chegando um ônibus no
ponto. Uma luz se acendeu em minha memória, talvez uma intuição e uma vaga lembrança de que aquele ônibus era
o que eles costumavam pegar, em outras ocasiões os vi tomando aquele transporte
para aquele bairro. O “buzu” parou, eu voltei e perguntei pra eles:
- Pra onde vocês vão? Que ônibus vocês
pegam?
O homem não respondeu, mas a mulher falou o lugar. Aí eu disse:
- O ônibus é este que parou.
Dei a mão para o motorista
esperar, ele esperou e eles foram embora, um pouco antes de subirem o homem
cego perguntou:
- É Tânia?
Eu respondi:
- Não. Seu ônibus é esse, tchau!
Não dava tempo me apresentar, explicar quem
eu era etc.
Continuei a minha caminhada
até a minha casa e fiquei muito feliz por ter podido ajudar. Normalmente já
faço isso, ajudo as pessoas que precisam pela rua: atravesso pessoas idosas,
cegos, dou informações corretas, levo até os lugares, se for necessário, cedo o
lugar no ônibus. Ajo politicamente correto sempre que é necessário, não pra
aparecer, mas porque aprendi com meus pais a respeitar e a tratar bem todas as
pessoas.
Alba Brito Mascarenhas
Salvador, 28 de agosto de
2013
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